França-Brasil: Um interesse muito além da cultura
“Graças a valores compartilhados, a uma inegável proximidade intelectual e a uma mesma visão política, a França e o Brasil constituíram um sólido capital de simpatia e admiração recíprocas. Essa herança não é um patrimônio adormecido, mas um fermento para a ação futura de modo a construir, ao invés de assistir à construção do novo século.”
Assim começa o release oficial do Ano da França no Brasil, 2009. Uma parceria que começou há tempos fortalecendo-se em 2005 com o “Ano do Brasil na França” e que se solidificou este ano. A inauguração ocorreu no dia 21 de abril, Feriado de Tiradentes, às 20h, com o espetáculo pirotécnico multimídia “O Encontro da Água e do Fogo”, na Lagoa Rodrigo de Freitas, no Rio de Janeiro. A programação – eventos artísticos, culturais, científicos, tecnológicos, acadêmicos e econômico/comerciais – acontece em todo o território brasileiro até 15 de novembro, 2009.
Inegavelmente, o “Ano da França” é uma importante manifestação para o aprofundamento das culturas, mas como sabemos essa parceria é muito mais estratégica do que cultural. Ainda no release do “Ano da França” encontramos: “Nossos respectivos países têm a ambição de juntos, possuir mais peso nos negócios do mundo. Por dividirem uma mesma visão os dois países devem empreender uma ação convergente. Atores globais que compartilham os mesmos valores democráticos e sociais, a mesma ambição de construir um mundo mais justo, aberto e diversificado, ambos acreditam que sua mensagem será melhor ouvida se for apresentada em uma única voz.”
VAMOS AOS INTERESSES:
De acordo com o relatório do Greenpeace “O Fracasso Nuclear Brasileiro”, a França, como país líder na geração elétrica nuclear, vem promovendo o renascimento desta tecnologia ao redor do mundo. A "história de sucesso" do programa nuclear francês é amplamente difundida pelos porta-vozes da indústria nuclear brasileira, que encontram respaldo nas declarações e propostas de financiamento da estatal nuclear francesa Areva – uma das maiores patrocinadora dos diversos eventos culturais do “Ano da França no Brasil”.
O renascimento do programa nuclear brasileiro, decidido pelo governo do presidente Luiz Inácio Lula da Silva com a autorização para a construção de Angra 3 em 2007, mascarada por argumentos de fachada relacionados à contribuição desta energia como solução para as mudanças climáticas e como fundamental para garantir a segurança elétrica do país.
Hoje, Lula e o presidente da França, Nicolas Sarkozy, assistirão ao desfile cívico-militar em comemoração ao Dia da Independência na Esplanada dos Ministérios e, logo depois, terão uma reunião de trabalho, na qual representantes dos dois governos assinarão uma série de acordos nas áreas de defesa, cooperação policial, imigração, transportes, agricultura, tecnologia, entre outras. Porém, o mais esperado é a assinatura da construção conjunta de um submarino de propulsão nuclear e outros quatro convencionais do modelo francês Scorpène, assim como do estaleiro onde os navios serão fabricados e de uma base naval de apoio.
Ainda na área da defesa, outro acordo, causa expectativas: a construção de 50 helicópteros de transporte do modelo francês EC-725 para as Forças Armadas brasileiras, que serão fornecidos entre 2010 e 2016 por um consórcio formado pela brasileira Helibras e pela europeia Eurocopter, filial do grupo EADS. Juntos, somente estes projetos custarão aos cofres públicos US$ 12,317 bilhões até 2021.
Vale lembrar que a Constituição Brasileira, em seu 21º artigo, inciso XXIII, assegura que: “Toda atividade nuclear em território nacional somente será admitida para fins pacíficos e mediante aprovação do Congresso Nacional” (BRASIL, 1988).
Ao se associar à indústria nuclear francesa inclusive para o uso militar da tecnologia atômica, o Brasil cria um vínculo de dependência geopolítica – assinado, curiosamente, no dia da “independência brasileira” - com aquele país em uma clara indicação de que os objetivos do seu programa nuclear vão muito além da geração de eletricidade.
Tanto do ponto de vista econômico como de impactos ambientais, a energia nuclear não é, nem de longe, a melhor opção, já que a geração nuclear continua sendo a mais cara, mais insegura e mais poluente, especialmente em um país com o potencial de fontes renováveis como o Brasil.
Fontes:
Greenpeace – O Fracasso Nuclear Brasileiro
http://www.greenpeace.org/brasil/documentos/nuclear/o-fracasso-nuclear-brasileiro
Jornal O Estado de S. Paulo
http://www.estadao.com.br/noticias/nacional,sarkozy-chega-ao-brasil-para-assinar-acordos-com-lula,430531,0.htm
Publicado também em minha coluna no site: www.gazetadomorumbi.com.br
No comments:
Post a Comment